B. Números complexos e fasores

Jaime E. Villate e Luís Miguel Martelo
(17 de agosto de 2025)

B.1 Números complexos

A forma retangular de um número complexo z é

z=x+iy (B.1)

onde x (parte real) e y (parte imaginária) são dois números reais, no campo dos números reais, i é a unidade imaginária, i=1, e o produto iy representa um número imaginário. A figura B.1 mostra o chamado plano complexo, que é um plano onde cada ponto corresponde a um número complexo z; as suas partes real e imaginária são as projeções x e y em dois eixos perpendiculares, designados por Re (eixo real) e Im (eixo imaginário).

Número complexo
Figura B.1: Número complexo z=x+iy representado no plano complexo.

Definem-se o módulo |z| e o argumento φ do número complexo z:

|z|=x2+y2  φ=Arctan(x,y) (B.2)

onde Arctan é a função definida em (A.34) e o argumento está no intervalo π<φπ.

No plano complexo, |z| é a distância desde o ponto onde se encontra z até à origem, e φ é o ângulo que o segmento desde z até à origem faz com o semieixo Re positivo (ver figura B.1).

Um número complexo z pode então ser escrito também na chamada forma polar projetando as suas partes real e imaginária nos eixos Re e Im:

z=|z|(cosφ+isinφ) (B.3)

A função complexa entre parêntesis na equação (B.3) costuma ser designada por cis(φ), ou ainda por eiφ, por ter propriedades semelhantes à função exponencial real ex. Para mostrar mais facilmente algumas operações entre números complexos, escreveremos a forma polar em algumas das duas notações seguintes:11A expressão eiφ=(cosφ+isinφ) é designada por fórmula de Euler.

z=|z|eiφ    z=|z|φ (B.4)

A soma de dois números complexos, z1=x1+iy1 e z2=x2+iy2, é outro número complexo, z1+z2, com partes real e imaginária iguais à soma das respetivas partes dos dois números:

z1+z2=(x1+x2)+i(y1+y2) (B.5)

esta é a mesma forma da soma de dois vetores no plano xy, em função das suas componentes. Como tal, a soma de números complexos segue a mesma regra do paralelogramo, no plano complexo, da soma de vetores, como mostra a figura B.2. E a soma de números complexos tem as mesmas propriedades da soma de vetores.

Adição de números complexos no plano complexo.
Figura B.2: Adição de números complexos no plano complexo.

Em contraste com os vetores, no caso dos números complexos é possível definir um produto que dá como resultado um outro número complexo e tem as mesmas propriedades do produto entre números reais (comutatividade, associatividade, distributividade, etc.). O produto entre dois números complexos, z1=x1+iy1 e z2=x2+iy2, é outro número complexo, z1z2, que pode ser obtido usando a sua propriedade distributiva e o facto de que i2=1:

z1z2 =(x1+iy1)(x2+iy2)
=x1x2+i2y1y2+ix1y2+ix2y1
=(x1x2y1y2)+i(x1y2+x2y1) (B.6)

Produto este que tem uma expressão mais simples em termos das componentes polares dos números complexos:

z1z2=|z1||z2|ei(φ1+φ2)=|z1||z2|(φ1+φ2) (B.7)

Ou seja, o produto z1z2 tem módulo igual ao produto dos módulos de z1 e z2 e argumento igual à soma dos argumentos de z1 e z2. E a divisão é feita dividindo os módulos e subtraindo os argumentos:

z1z2=|z1||z2|ei(φ1φ2)=|z1||z2|(φ1φ2) (B.8)

Define-se o conjugado, z*, do número z, mantendo o módulo igual mas trocando o sinal do argumento:

z*=|z|eiφ=|z|φ=xiy (B.9)

O produto de um número complexo com o seu conjugado é igual ao seu módulo ao quadrado:

zz*=z*z=|z|2 (B.10)

B.2 Fasores

As funções sinusoidais com a forma geral:

f(t)=fmáxcos(ωt+φ) (B.11)

são caraterizadas pela sua amplitude fmáx, frequência angular ω e fase inicial φ.

A forma polar (B.3) de um número complexo mostra que a sua parte real é,

Re(z)=Re(|z|eiφz)=|z|cos(φz) (B.12)

o que sugere uma outra representação para as funções sinusoidais (B.11):

f(t)=Re(fmáxei(ωt+φ))=Re(fmáxeiφeiωt) (B.13)

A expressão fmáxeiφeiωt entre parêntesis na equação (B.13) é a representação complexa da função sinusoidal f(t), a qual é uma função real. Quando as funções sinusoidais envolvidas possuem todas a mesma frequência angular ω, então o factor comum eiωt das suas representações complexas pode ser omitido durante os cálculos e reinserido posteriormente. Define-se então o fasor da função f(t) como o número complexo,

𝐟=fmáxeiφ=fmáxφ (B.14)

A relação entre uma função sinusoidal f(t) e o seu fasor 𝐟 é portanto dada por:

f(t)=Re(𝐟eiωt) (B.15)

Um fasor é pois uma outra representação de uma função sinusoidal. Apesar de um fasor ser representado como um número complexo, não é um número complexo ordinário, pois possui implicitamente uma dependência temporal. Uma das vantagem de se usarem fasores é que operações tais como a soma, a multiplicação ou divisão por um número complexo, a derivação ou a primitivação de funções sinusoidais são muito mais fáceis de serem efetuadas usando os seus fasores do que usando funções sinusoidais.

Consideremos uma segunda função sinusoidal g(t) com a mesma frequência angular ω que a função sinuisoidal f(t) da expressão (B.11), mas com valor máximo e argumento diferentes:

g(t)=gmáxcos(ωt+α)=Re(𝐠eiωt) (B.16)

onde 𝐠=gmáxeiα=gmáxα é o fasor de g(t).

A soma das funções f e g é então:

f(t)+g(t)=Re(𝐟eiωt)+Re(𝐠eiωt)=Re[(𝐟+𝐠)eiωt] (B.17)

onde usámos a propriedade de que a parte real da soma de dois números complexos é igual à soma das suas partes reais (ver expressão (B.5)).

Ou seja, a soma das duas funções sinusoidais com a mesma frequência é também uma função sinusoidal com a mesma frequência angular ω cujo fasor é igual à soma dos fasores das duas funções, a qual é uma simples soma de números complexos. A maneira mais simples de somar fasores consiste em transformá-los da forma polar para a forma retangular, somar as partes reais e imaginárias, e escrever o fasor da soma na sua forma polar.

Note-se o uso da notação especial para os fasores, 𝐟, devido a que, apesar de se somarem como números complexos que são, dando outro fasor, o produto complexo entre dois fasores dá um número complexo, mas este já não representa o fasor de nenhuma função sinusoidal.

Contudo, o produto de um fasor por um número complexo ordinário z=|z|eiφz é também um fasor. Considerando o fasor 𝐟 dado pela expressão (B.14), temos então:

z𝐟=|z|fmáxei(φ+φz)=|z|fmáx(φ+φz) (B.18)

o qual representa a seguinte função sinusoidal:

h(t) =Re(z𝐟eiωt)=|z|fmáxcos(ωt+φ+φz) (B.19)

O produto de um fasor por um número complexo traduz-se portanto em multiplicar o módulo do fasor pelo módulo desse número complexo e somar ao seu argumento o ângulo desse mesmo número complexo.

A derivada da função f(t) é igual a:

f(t)=ωfmáxsin(ωt+φ) (B.20)

a qual pode ser também escrita como:

f(t)=ωfmáxcos(ωt+φ+π2) (B.21)

que é outra função sinusoidal, com fasor ωfmáx(φ+π/2). Isto é, o resultado da derivação de uma função sinusoidal é multiplicar o módulo do seu fasor por ω e aumentar π/2 ao seu argumento.

O mesmo resultado pode ser obtido mais facilmente derivando a expressão (B.15). Notando que a derivada da parte real é igual à parte real da derivada, temos que:

f(t)=Re((𝐟eiωt))=Re(iω𝐟eiωt) (B.22)

O qual mostra que o fasor da derivada de f é o fasor de f vezes iω:

iω𝐟=(ωπ/2)(fmáxφ)=ωfmáx(φ+π2) (B.23)

De forma semelhante, como a primitiva da parte real é igual à parte real da primitiva, a primitiva da expressão (B.15) conduz a:

f(t)dt=Re(𝐟eiωtdt)=Re(𝐟iωeiωt) (B.24)

E conclui-se que o fasor da primitiva de f é o fasor de f dividido por iω:

𝐟iω=fmáxφωπ/2=fmáxω(φπ2) (B.25)

Em t=0, a expressão (B.15) mostra que f(0)=Re(𝐟). Já em t>0, eiωt=1ωt é um número complexo com módulo unitário e argumento ωt que aumenta diretamente proporcional ao tempo. O produto do fasor por eiωt deixa o seu módulo igual mas faz rodar o seu argumento em ωt, no sentido positivo (do eixo Re para o eixo Im). Como tal, o fasor roda no plano complexo, com velocidade angular ω constante e a cada instante t o valor da função f é a projeção do fasor, após rodar, no eixo Re. O lado esquerdo da figura B.3 mostra a representação do fasor 𝐟, como um vetor no plano complexo, e o lado direito mostra o fasor multiplicado por eiωt, em quatro instantes: t0=0, t1=T/4, t2=T/2 e t3=3T/2, em que T=2π/ω é o seu período de rotação (em cada intervalo T/4 o vetor roda ωT/4=π/2 radianos).

Fasor
Figura B.3: Fasor 𝐟 no plano complexo (esquerda) e valores de f(t) em 4 instantes (direita).

Os valores da função f(t) nos quatro instantes t0, t1, t2 e t3 são as quatro coordenadas f0, f1, f2 e f3 do vetor no eixo real. Os fasores são vetores que rodam no plano complexo, em função do tempo; os fasores de funções sinusoidais com a mesma frequência rodam com a mesma velocidade angular e, portanto, a soma deles também roda com a mesma frequência.